quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
30
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
para um desconhecido qualquer
Te encontrei dentro do livro do Edwin Morgan, what fear was it that made the wind sound like fire, e dobrei a pontinha da página pra depois. Porque o depois vem quando eu menos espero - olha, nem lembrava, mas eu achava esse tão bonito... O que eu sempre gostei gostei em você foram as surpresas.
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
Bergman e eu
Faço isso há tempos; lá se vão sete anos. Mas até hoje eu realmente não sei o que sinto pelo Bergman. Não sei qual meu filme preferido do Bergman. Na minha falta de conhecimentos cinematográficos, nunca consegui ficar magnetizada com nada do Bergman - ele não tem aquela piração perfeccionista do Kubrik, nem aquela fotografia maravilhosa que o Christopher Doyle faz nas coisas do Wong Kar-Wai, nem o charme cafajeste do Fellini, nem o brilhantismo do Godard, nem a cafonice podrona-maravilha do Almodovar. Nope. Nada.
Gosto do Bergman porque ele é simples. Ele não tem nada de difícil. Nada de virtuoso, fenomenal. Acho até que ele devia ser um sueco feio de meias e chinelo. Não existe catarse, não existem grandes projetos, não existe final - nem triste, nem feliz. Gosto do Bergman, acho, porque ele é cru como uma porção morna da comida que a gente come todo dia.
É raro, mas de vez em quando eu deito na cama e choro, sempre de noite, mas por nada. Por nada mesmo, no sentido típico, pela solidão inexorável que nunca nunca nunca vai ter remédio, por ter feito da vida isso e aquilo, por não ter escapatória para além de acordar no outro dia e ter que escovar o dente, conversar, fazer o café, tédio. Às vezes eu choro, ou durmo demais, ou falo demais, ou fico quieta porque pra lá das minhas plantas e afazeres diários não existe muita coisa, mesmo. Uma caixa cheia de memórias, narrativas desconjuntadas e esperanças mais ou menos obscuras, pronto, é só isso que eu consigo ser.
O Bergman resolveu parar na frente desse vazio e ficar olhando, como se fosse o filho dele brincando no parquinho. A impressão que eu tenho é que ele abraçou isso e nunca teve pressa pra resolver. Eu gosto do Bergman, acho, porque ele me faz sentir acompanhada pelo meu nada próprio e até a fazer festinha pra ele. Eu adorei o último filme que assisti do Bergman, no começo da semana, porque a personagem principal chamava Marianne, como eu, e a atriz era a Liv Ullman. Mas ficou muito triste depois da terceira hora e eu resolvi assistir o resto no semestre que vem.
Eu gosto do Bergman do mesmo jeito que eu gosto de deitar no chão e ficar de olho fechado, sem ninguém por perto, sem esperar. Ali.
sábado, 24 de julho de 2010
in love with Derrida
"chaque fois que le pardon est effectivement exercé, il semble supposer quelque pouvoir souverain. (...) Ce dont je rêve, ce que j'essaie de penser comme la 'pureté' d'un pardon digne de ce nom, ce serait un pardon sans pouvoir: inconditionnel mais sans souveiraineté."
caderno de anotação
De tudo, o mais difícil agora é contar a história.
No começo, não. No começo o pior eram os domingos à tarde, os sábados à noite, a casa vazia, o telefone sem tocar. Era lembrar de quando você lia jornal de luz apagada de manhã cedinho, e de não entender, de verdade, de verdade, como seria possível viver sem ter isso todo dia.
No começo eu deitava na pontinha da cama, deixando espaço pra você, e pensava que talvez uma hora ou outra você fosse dormir ali de novo. Eu sentia sua ausência como se ela fosse uma pessoa. No começo, e um pouco depois, eu quase conseguia ouvir você me dizendo isso ou aquilo; eu tentava adivinhar se você tinha emagrecido, e bem lá dentro eu achava que sabia que você devia pensar em mim de vez em quando, como se eu fosse tão especial que.
No começo havia o que era só nosso. Os nossos segredos, aquele programa que só a gente fazia no domingo, aqueles discos que eu comprei e ouvi com você pela primeira vez. No começo, eu sentia a distância como um detalhe besta; e no começo, apesar de eu ter partido, e você também, você era em mim e eu era em você. Na dedicatória do livro que eu entendia, nas memórias que só faziam sentido na primeira pessoa do plural.
No começo era a falta, mas existiam nossos lugares sagrados. No começo, era o não você, e no começo era o não saber, era o não estar que deixavam os dias longos e as noites mas compridas ainda, mas era só. De alguma maneira você estava. Sempre.
Depois do começo, o que eu perdi primeiro foi a sua voz. Depois foi o seu cheiro. Depois, seu jeito de andar, que eu fui esquecendo, até não lembrar mais. E daí vieram as notícias sobre você, aquelas que eu esperava te ouvir contando, que eram nossas, e que eu fui sabendo por outros, muito, muito tempo depois de terem acontecido, e foi como se eu perdesse o seu rosto. E com as notícias dadas pelo não-você, lembrei de todas as coisas que você não tinha me dito. Lembrei do seu jeito de não telefonar, e de tudo que você tinha me falado na hora errada.
Eu me afastei, e depois foi o não te reconhecer. Não entender porque você me tratava como estranha, nenhuma initimidade, conversa genérica de msn. Não entender porque você fingia que não tinha me visto naquela festa. Não entender como de uma hora pra outra plim, todas aquelas coisas que a gente conversava tinham desaparecido, você não tinha mais nada a ver com aqueles problemas, eu, hein?, tudo novo, agora a vida mudou. Cena de videoclipe: você ali no Alaska, corta, o cenário agora é um quarto de hotel, e depois um bote, uma corrida de kart e e e.
De tudo, o mais difícil agora é contar a história. Ainda tenho saudade, mas não sei direito se é de você. Não sei mais direito do quê. Espio nossos segredos, e fico confusa, acho que eles eram só meus, primeira pessoa do singular, isso sim, e todos esses discos, livros, fotos, memórias, tudo, tudo está fora do lugar. Como se tivessem entrado de sapato na casa de um japonês velhinho, como a bomba que o sérvios jogaram bem em cima da biblioteca muçulmana no centro de Sarajevo, como se profanassem todos os lugares intocados e inocentes do mundo, como sacolinha descartável, como pagar a conta do restaurante, como me dá dois, cinquenta reais, ok, opa, desculpa, acabou, volta outro dia, hoje não tem, como um delírio, uma febre, uma coisa que aconteceu but not quite, um caderno de anotações contando a vida de uma outra pessoa.
quarta-feira, 30 de junho de 2010
sonhei...
para
domingo, 13 de junho de 2010
love´s not a lost land
Dizem que no inverno da Escandinávia as pessoas saem na rua pra tomar sol, simplesmente. Aqui é igual. O clima me dá alergia instantânea: chegar e ficar com o nariz entupido. Sempre odiei. Sempre odiei o vento encanado na XV, minha sala horrorosa no prédio-fantasma da faculdade de direito, ter que esquentar a calça jeans embaixo da coberta pra poder vestir de manhã quando faz frio, as pessoas usando jaquetas de couro feias de matar. Sempre odiei o complexo de bares da Carlos Cavalcanti, os festivais de pieroghi, um certo sentimento de cidade do interior e, acima de tudo, sempre odiei um certo modo de vida Madalosso de final de semana.
Esse inverno aqui está horroroso, parece que começou em março. Mas eu gosto desse frio, estranhamente. Mas dessa vez eu gosto de estar aqui, estranhamente. Das pessoas, das memórias, do meu quintal. Dos mesmos amigos, das mesmas histórias, de fotografia, de tudo. Do não-descartável da vida, do compromisso, do amor. De tudo que tem de denso, lento, abismal no frio e nas cidades que nos significam. E assim, simplesmente, percebo que eu sou definitivamente uma pessoa de invernos, e que é bom estar aqui de novo. Love's not a lost land.
quinta-feira, 10 de junho de 2010
última palavra
Look at the stars.
And I'll kiss you again
Between the bars
Where I'm seeing you there
With your hands in the air
Waiting to finally be caught
Nesse dia, meu amor, disputamos o poder da última palavra. Nós dois: eu te olhando daqui, enquanto você, do lado de lá da mesa, explicava que era minha hora de escolher - touché.
Eu te vi mais uma vez trilha sonora bem feitinha, um acorde encaixado no outro, com as sempre guardadas e devidas proporções, o cabelo desalinhado combinando sem querer com o casaco e o tênis velho. Você, escondido no fundo da pista de dança, low profile e sexy, falando baixinho, dizendo distraído a coisa certa, enquanto eu, desastrada e sem medidas, derrubo mais uma vez a xícara de café em cima do meu livro de literatura.
Você, meu amor, nunca vai precisar disputar a última palavra comigo. Eu já escolhi (você também?), e agora tanto faz quem vai dizer o quê por último - você, reservado e blasé, é sua, não faz diferença pra mim, a última palavra pode ser sua. Não importa mais.
... enquanto você toma um café expresso e eu arrumo o cabelo devagar, memórias desfeitas, quilômetros de distância.
domingo, 14 de março de 2010
30 - loja de aquários e sentido da vida
E tinha um aquário marinho enorme que dava pro lado de fora, e que eu conseguia ver enquanto comia um sunomono e tomava uma ordinária coca-light.
Eram oito horas da noite, eu terminei o temaki e entrei pra ver os peixes. Tinha muita criança, também, e a loja era linda, pequena, e o vendedor de trinta e cinco anos me mostrou que num dos aquários, se você abaixasse bem a cabeça, dava pra ver as bolhinhas saindo do tapete de plantas, e que isso era ver a fotossíntese.
Vi um peixe amarelo e roxo enorme e virtuoso, e vários aquários pequeninos e lindos com um peixe beta sozinho em cada, e aí eu perguntei pro mocinho se não era terrível que esses peixes tivessem um aquário inteiro só pra eles, vivessem solitos.
Ele disse que sim, que eles se sentiam poderosos, mas que no fundo odiavam e acabavam se tornando animais intragáveis, arrogantes e deprimidos (tudo ao mesmo tempo). E mostrou o que seria ideal: misturar os peixes beta com outros peixes menos violentos num mesmo aquário pra que eles ficassem domesticados. Perguntou se eu queria comprar um assim.
Lógico que sim, esse é o meu aquário - eu só pensei. Há realmente muito o que aprender com os peixes. Às vezes lojas de aquários contêm o sentido da vida. Especialmente pra mim, especialmente às vésperas dos meus trinta anos. Connecting the dots; tô pra ver o que mais essa crise vai me dar, adorando.
30 - sobre ação e desejo
Porque eu sempre tive esse medo terrível de machucar qualquer pessoa e também, muito, de ser machucada, e por isso eu nunca consegui muito segurar os nenéns, já que eles são minúsculos e frágeis e podem chorar a qualquer momento; e sempre foi aquela tragédia pra paquerar, então sempre esperei que por um milagre aquele menino x pudesse resolver vir falar comigo e.; e nunca realmente dei uma festa de aniversário, porque e se ninguém aparecer, meu Deus... Do lado de cá, dentro de mim, um vasto universo, emoções imperfeitas, então eu fiz tudo tudo tudo que eu não fiz do lado de lá - viajei pra longe, muito longe muitas vezes, sozinha e independente, trabalho na coisa mais bonita que existe no mundo, estudei muito muito e passei num super mestrado e tal, e então é comum as pessoas me procurarem pra pegar emprestado aquele livro de literatura que só eu sei indicar porque tem a ver com elas, e dizerem que eu sou forte forte forte, ainda que doce. A cápsula da mulher maravilhas, independente e nem aí, essa eu construí, e ninguém nunca soube neste mundo que eu, na verdade, sou tímida de quase morrer de vergonha de tudo. Pra dentro o meu desejo é ilimitado e possível. O que não consigo, mesmo, é cruzar a muralha da China do outro, e mesmo que eu morra de vontade de construir vínculos, tenho muito medo de não dar certo, de eu abandonar ou ser abandonada. Então eu vou embora antes.
Até que PLIM, na última sessão de análise, e foi tão bonito que eu nem precisei derramar nenhuma lágrima, e saí pelo mundo mandando mensagem "quero te ver", discutindo relações mesmo que elas tivessem 10 dias, porque isso era importante pra mim mesmo que fosse chato pro outro, e que embora fosse chato, eu precisava realmente dividir pra entender, e por enquanto é isso, e não me importa tanto a resposta quanto me importa a minha ação. E me senti realmente forte.
A crise dos 30 é a coisa mais tenebrosa pela qual eu já passei, certamente. É equacionar o fato de estar fora do tempo, de não ser o que eu era pra ser e não saber o que é que vou me tornar, de ter amigos em todas as partes do mundo mas não perto de mim, e, cada vez mais, de me surpreender ouvindo mais jazz que rockn'roll e um pouco achar isso esquisito; de pais ficando velhinhos e longe e aí vai. Mas pelo menos agora está começando a fazer muito sentido, e estou começando a adorar. Connecting the dots. Os 30 vão ser demais.
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
sobre hipotermia
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
30 - sobre o ordinário
minha vida sempre foi um esforço louco por amar o dia-a-dia, o comum, o detalhe óbvio que ninguém repara, o som da chuva, o domingo, os vínculos que a gente cria, recria e reinventa o tempo todo. um esforço cão para dar vida ao lugar-comum.
nunca consegui. não tenho esse dom, definitivamente. só tenho capacidade de amar o pequeno quando ele é extraordinário, muito muito extraordinário pra mim. odeio a remota ideia de que eu vou viver na mesma cidade pelo resto da vida. pessoas lindas, absloutamente lindas são só aquelas que eu amo, e o mundo se divide entre elas e um monte de gente sem graça de quem eu esqueço o nome. eu gosto de olhar a minha foto preferida dez mil vezes, e cada vez eu vou tratá-la com uma cor a mais no photoshop, e isso vai demorar, sim, uma hora e quarenta, e ninguém neste planeta vai suportar ficar perto de mim; e pra sempre sempre sempre vou ver o ballad of the sexual dependence da nan goldin com lágrima no olho, e ouvir she came through the bathroom window ou berlin e ficar quietinha 30 segundos depois porque é tão lindo que. não adianta, porque eu falo no superlativo, faço esportes até o limite das minhas forças e depois me machucho tanto que não existe fisioterapia que me recupere, e indefectivelmente como macarrão ao sugo até explodir. sou uma tragédia ambulante, um treco movido pela compulsão do extraordinário. só amo as coisas quando elas são tão especiais que me fazem sair do conhecido mil vezes.
mais do que nunca, sinto que o mundo requer que eu passe a amar o ordinário agora, quando estou estou chegando perto dos 30. todo mundo com filho, todo mundo querendo comprar terreno, a maioria com um carro melhor do que antes, as famílias dos meus amigos vão crescendo, e cada vez mais vem o "adivinha quem tá grávida, Mari?". acho bonitinho. entendo. não faz nenhum sentido pra mim.
às vezes eu me sinto como se fosse uma alienígena. de vez em quando eu sofro, e esses tempos andava meio triste, meio quieta sem saber por quê, sem nem saber se era tristeza, mesmo, ou se um nem saber o que sentir, um lugar nenhum. já acordei de noite duas vezes, assustada, com vontade de chorar, e chorei porque era bom, bom chorar. sem nenhuma razão.
fiquei com vontade de amar o ordinário. não consigo. não amar o ordinário faz sofrer. depois de 3 anos de análise realmente descobri que fico mais feliz fazendo parte de outro planeta, que não ter que amar o inamável é a melhor forma de respirar. and I kinda like it.
saí e comprei uma bicicleta azul de corrida.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
30 - uma carta rancorosa a 2009
Que eu amei, lógico. Eu esperava que você dissesse que no fundo eu sou bem literal e chorona, ou que no fundo eu sou bem melancólica e pouco direta. Tanto fazia.
Mas não havia Avatar 3D antes, e você não estava lá quando foi finalmente lançado no cinema. Foi só quando entrei em casa depois da sessão, quando quis ouvir pessoas falando mais, que notei que você estava lá, sim, porque 2010 começou sem palavras, num silêncio suspenso típico de você, como uma porta um segundo antes de abrir, como o dentro da geladeira, como o momento breathtaking imediatamente depois de se entrar na água gelada. Como algo que existe, but no quite, como alguém que existe, but not yet, como uma banana com laranja que acabaram de entrar no liquidificador e ainda não viraram suco.
Talvez banana e laranja não combinem; espero que só esteja faltando a proporção correta. Portanto está na hora de você sair de casa; bem-vindo, 2010, faça o favor de entrar.