segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Pequenas humanidades

O fato é: fiquei cansada dos grandes temas da humanidade.
Comprei o Le monde diplomatique Brasil hoje de manhã e me deu nos nervos. Não é que concorde ou discorde dos artigos; é outra coisa. É uma indisposição, ou talvez pura e simplesmente uma falta de de paciência para refletir sobre o papel do indivíduo e a condição de vítima nas ações humanitárias internacionais, sobre os cenários futuros e possíveis desdobramentos da crise americana, sobre o resultado da eleição nos Estados Unidos. E o problema vai além da geopolítica e da economia mundiais. De uma hora para a outra, passou a valer para as grandes reflexões sobre relacionamentos afetivos, sobre a realização de sonhos profissionais, sobre a solidariedade e o amor ilimitados entre os amigos.
Na minha última sessão de análise, cheguei à conclusão: tornei-me uma megera. Sem pudores para dizer não, sem minhas risadas altas e bestas - inclusive sem senso de humor -, sem minhas típicas falas sobre a esperança na humanidade. Agora fiquei econômica com as palavras, e não fico na sala depois de acabar a reunião, discutindo possíveis ações cooperativas - está encerrado, estas são as tarefas de cada um, ponto final. Até emagrecer eu emagreci.
Achei que seria o meu fim: depois de 3 anos de disco arranhado tocando frustrações amorosas, um ano e meio de sessões intensivas de psicanálise, e ouvido ultra-cansado dos meus amigos mais próximos, pensei, virei exatamente o avesso de mim mesma. Sou azeda, brava e pouco poética. Deixo de ser fraca para ser forte, segura e incisiva.
O que me salvou foi descer pra levar o Tufik para passear e no início do passeio dividir minha mixirica com o porteiro. Ficamos conversando, eu e ele - as modificações na quadra, a biblioteca popular, as vagas na garagem, um menino que foi sequestrado nas redondezas ontem à noite. Ufa. No fundo, no fundo, a compaixão pelo outro beneficia sobretudo a pessoa compassionada. Volto a me sentir uma pessoa depois do dia cão em que me tornei supra-humana. Salve a dúvida, o sonho, a incerteza, a coragem de amar e a coragem de sofrer; os passeios noturnos com o cachorro e sobretudo, neste momento, o senhor Egídio, porteiro das mais altas virtudes. Hoje sou fã das pequenas humanidades.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

And then

Então existem esses dias em que a gente repara numa coisa qualquer que nos traz à percepção o óbvio de termos nos tornado uma pessoa absolutamente diferente.

Pra mim nunca é transcendental. Nunca é como se, de uma hora para outra, estivesse abandonando meu velho eu para me tornar uma nova mulher, revigorada, mais forte, mais cética, mais sei-lá-o-quê. Não. Pra mim é como um reflexo retardado, mesmo, a surpresa que existe no reconhecimento de algo que já foi consumado. Ou talvez o certo fosse dizer que o momento da consumação seria mesmo este do reconhecimento, com o processo todo da mudança já passado.

Assim é pra mim, mas acho que muda de acordo com cada pessoa. É que tenho mesmo uma relação de retardo com o tempo; preciso terminar cada coisa para sentir como foi na época em que aconteceu. Acho que sou viciada em classificar para sentir. (Se o Wagner lesse isso, diria que tenho dificuldade em ser contemporânea de mim mesma).

Como certo, ando mais calada. As pessoas perguntam se é tristeza ou alguma coisa congênere. Não saberia responder ao certo. Simplesmente ando sem saber direito o que dizer. Mas continuo gostando de observar as coisas, de ouvir os outros conversando, de ficar olhando as pessoas no aeroporto enquanto espero o próximo vôo.

Pode ser o fenômeno de chegar perto dos 30.